Artigo: O crime, a punição e a recuperação.

Más condições de carceragem: Faltam 60 mil vagas no sistema penitenciário brasileiro. (foto: Ricardo Borba - CorreioWeb).
* PAULO CÉSAR NUNES DA SILVA Desde os primórdios da humanidade que o fator “punição” existe. É a forma mais simples e direta de coordenar e tornar harmoniosa a convivência interespecífica. Barbáries foram cometidas ao longo dos tempos em nome da paz social. Michel Foucault aborda a questão do desenvolvimento histórico da instituição prisão, desde o seu nascimento até a sua atual aplicação. Não se sabe ao certo a origem da prisão, acredita-se que a privação de liberdade acrescida de uma dose de suplício acompanha a espécie humana desde a sua organização básica como grupo social. Porém é no decorrer do período medieval que inúmeras barbáries são cometidas, talvez, seja este o período com o maior número de casos de punições severas, que para os padrões atuais são consideradas “selvagens”. Corpos mutilados, torturas inimagináveis, dor e sofrimento, todos elementos jurídicos de um processo de apuração do ato, julgamento e condenação. Parece cínico referendar tais métodos como “julgamento”, porém é a realidade, todos os processos eram legais e consentidos pelas mais altas autoridades da época; o “julgamento” acontecia em paredes privadas, sem o conhecimento público e na maioria das vezes sem o próprio consentimento do acusado. Defesa? Bem, não era legitimada nenhuma forma de defesa, a não ser a própria confissão que na maioria das vezes poupava o condenado da tortura, levando-o diretamente à forca ou à decapitação. O suplício é uma pena corporal, produz um certo sofrimento equivalente ao crime produzido (é quantitativo), faz parte de um código jurídico da dor. Não deve nunca ser esquecido pelos homens, que o guardarão eternamente através das marcas em seus corpos. O suplício ainda era ostentoso, era mostrado como um triunfo do Estado sobre o condenado. Apenas a partir do século XVIII que se dá início a todo um movimento de mudança dos métodos de suplício medievais, a denominada “Economia do Castigo”, um arranjo de sofrimentos mais sutis, porém muito mais eficientes. É iniciada uma verdadeira prospecção sobre como fazer sofrer “humanamente”; é criada a tecnologia do sofrimento. Porém um fato marcante deve ser considerado, punições e principalmente execuções públicas praticamente desapareceram da Europa. O corpo sai das duras penas físicas e adentra no universo da coação e da privação da liberdade, da obrigação e das interdições. A data marcante é o início do século XIX, onde finalmente desaparece por completo o espetáculo da punição física, “não mais o corpo suplicado, e sim a alma”. O criminoso agora pode evoluir, modificar-se, tudo visando o seu controle absoluto. Ainda no final do século XIX chega-se a conclusão de que alguém pode ser louco e não criminoso, logo, tratado e não punido. Mas será que nos dias de hoje existe alguma diferença entre um presídio e um hospício? Qual será melhor? Provavelmente, nenhum dos dois. Ambos atuam enquanto exímios controladores de comportamento, submetendo os seus detentos às mesmas dificuldades e, até mesmo, aos suplícios (p.ex. o já desativado “Carandiru”, e muitos outros estabelecimentos penais brasileiros). Os mecanismos punitivos deveriam também atuar como receptores de mão-de-obra servil não remunerada, onde o preso é utilizado economicamente. Idéia muito criticada é a da utilização servil de mão de obra de detentos, porém talvez seja essa a única forma de poupar um homem que rompe para com o contrato social de uma punição severa e irrestrita. Ao exercer uma atividade, mesmo que não remunerada diretamente ele poderia estar se aperfeiçoando para futuramente exercer um determinado ofício ou até “pagando”, retribuindo à sociedade o mal que lhe causou. Talvez seja o trabalho a grande resposta para inúmeros juristas, pensadores e sociólogos que se ocupam em desvendar e resolver o problema da criminalidade. Já é superada hoje a visão do crime enquanto um “afronto ao Estado”, e a punição como uma vingança deste. A pena hoje é vista como uma forma de reintroduzir o indivíduo ao convívio social e para esse fim deve ser conduzida, dando realmente ao infrator a chance de ser novamente útil à sociedade, mostrando sua recuperação e não apenas sendo tratado como a escória desta. *Acadêmico do 2º ano de Direito da UNIGRAN. Artigo publicado no jornal Diário-MS, 04/04/2003.

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